quinta-feira, 24 de março de 2011

HEREDITARIEDADE

Humor hereditário
Tédio hereditário
Medo hereditário
Pavor hereditário.
Carma hereditário
Que persegue o que se nega.
Não acredito no que sinto
Da palavra
Do apego
Do destino
Do silêncio.

segunda-feira, 7 de março de 2011

As vezes me pergunto se vale mesmo a pena o esforço de ser correto. As vezes me deixo abater por uma revolta de muitos anos e quero jogar tudo pro alto, incrível que em todas essas vezes me arrependo de ter nascido, ou de continuar vivendo. Mas, aí percebo que de nada adianta praguejar. Contra Deus, contra minha vida, contra minha própria sorte. Não tenho o poder de mudar coisas que não escolhi pra mim. Afinal, acho que não escolhi ter nascido, nem escolhi a família a que pertenço, sei lá, é mesmo um mistério tudo isso. Mas, não estamos neste mundo para ter certezas e sim dúvidas. Se existe um Deus que esconde tudo de nós, temos que nos conformar em aceitar nossa condição de leigos e tentar mudar ao menos a sorte que escolhemos, aquela que nos cabe mudar, pra que assim possamos encontrar a paz em vida e não apenas na morte.

sábado, 8 de maio de 2010



Canto dos Emigrantes

Com seus pássaros
ou a lembrança de seus pássaros,
com seus filhos
ou a lembrança de seus filhos,
com seu povo
ou a lembrança de seu povo,
todos emigram.

De uma quadra a outra
do tempo,
de uma praia a outra
do Atlântico,
de uma serra a outra
das cordilheiras,
todos emigram.

Para o corpo de Berenice
ou o coração de Wall Street,
para o último templo
ou a primeira dose de tóxico,
para dentro de si
ou para todos, para sempre
todos emigram.

Alberto da Cunha Melo


terça-feira, 15 de dezembro de 2009




A noite tem olheiras

Na noite que não adormece
Alguém vasa os olhos
E corta a garganta de desespero.

Na noite que não adormece
Alguém pensa em partir
Para nunca mais voltar
Alguém volta mais triste que na partida

Na noite que não adormece
Bêbados duplicam as ruas,
Duplicam as luas,
E a única solução é a de estar bêbados.

Na noite que não adormece
Porque não deixamos,
Acontece o dia
Que nunca acorda a noite,
Porque a noite está sempre acordada,

Esperando por nós,
Homens e mulheres,
Partidos, tristes,
Alegres e desesperados.


João Bosco da Cunha Melo (Meu pai) do livro: Força Bruta







XVII


Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eue tinha...
Depois, de cada vez que me mataram,
Forma levando qualquer coisa minha...

E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada...
Arde um toco de vela, amarelada...
Como o único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Ah! Desta mão, avaremente adunca,
Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada!

Aves da noite! Asas do horror!Voejai
Que a luz trêmula e triste como um ai,
A luz do morto não se apaga nunca.

Tirado do livro: Rua dos cataventos (Mário Quintana)

sábado, 10 de outubro de 2009

Inverso






Eu sou a morte que a vida esqueceu de morrer,

Muitas vezes morri e até esqueci,

Esqueci que a vida é a morte ao contrário,

Então quando morrer

Não se espantem!

Para mim, a morte chegou atrasada.

Tecendo a teia


Sou uma parte de partícula geográfica,

Tecendo a teia do universo inteiro.

Sou a gota que falta para transbordar o copo,

O sopro que resta no pulmão de quem sofre.

Sou o último tijolo,

A última sorte,

A última chance de quem ama,

A última morte.

Última morte?

Será que a morte é única?

Só sabe quem morre.