sexta-feira, 6 de março de 2009

Olhos impunes





Daqui desta arquibancada
A tudo observo inválida,
Homens, mulheres e lágrimas
Constantemente são derramadas.
Os olhos cravados no chão da cidade,
As múltiplas sombras de um só corpo,
As calçadas, gélidas e indiferentes
A cada tambo.
Os gritos que daqui e ali ressoam
Gelam ainda mais o ar da madrugada,
Gelam ainda mais
As almas esfaceladas pelo medo.
Embriagadas de angústia,
Ou um vinho barato, vermelho e confidente,
O último de uma velha safra
Indesejável e contundente,
Triturando ainda mais
Da sobriedade que ainda restava
Daquele corpo raquítico e edemático,
Que ainda possui a esperança geriátrica,
De ter sua sentença elástica
Junto a ele enterrada.
Daqui desta arquibancada
A tudo observo apática.
Tenho dois olhos impunes,
Mil faces na cara,
E sou mais uma vítima
Que sente a dor ebriática,
De ter sanidade de sobra
E não ter inocência em nada.

2 comentários:

  1. Caralho, minha irmã - esse vc botou pra quebrar. Foi um soco no estômago e um tapa na cara. Adorei muito...Animal, continue escrevendo sempre com essa sua alma quebrada. Bjso e saudades! Ro

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  2. Marília, lembro-me que li esse poema quando ainda estava em grafite, num caderno, caderno desenhado pelo seu irmão. É emocinante ver que você não reprimiu sua sensibilidade. Forte abraço.

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